quinta-feira, dezembro 17, 2015

Como ultrapassar a crise politica sem sacrificar os direitos democráticos

Editorial do Savana
Depois da bancada maioritária ter votado contra a proposta da Renamo de revisão pontual da Constituição, tendo como objective a institucionalização das autarquias provinciais, parece ser imperativo que os dois principais partidos políticos encontrem uma solução política para o conflito que ainda persiste entre si.

O jogo de gato e rato na Assembleia da República simplesmente chegou ao fim, estando a ficar cada vez mais claro que não é ao nível do órgão legislativo de onde virá a solução. É um assunto político, que requer uma solução política, não legislativa.

A última proposta do partido de Afonso Dhlakama era, na essência, uma versão melhorada da anterior, incorporando alguns aspectos que teriam resultado dos debates em torno da versão original. Mas nem isso foi suficiente para se colher consensos.


A história do nosso órgão legislativo mostra que nunca a Frelimo irá votar a favor de uma proposta da Renamo ou de qualquer outro partido da oposição, mesmo que ela tenha algum mérito. O inverso também constitui verdade. Só que enquanto detiver a maioria parlamentar, a Frelimo está pouco preocupada com a atitude dos seus opositores; podem reprovar as suas propostas, a sua maioria as fará passar.

Então, se esta é a realidade, porque é que a Renamo continua a insister em apresentar propostas que logo à partida sabe que nunca serão aprovadas?

A resposta é muito simples. O objectivo é simplesmente o de embaraçar o seu adversário, desgastar a sua imagem e tentar projector uma Frelimo indisposta à paz, reconciliação e harmonia social.

E nisso a Renamo parece estar a ser bem sucedida. Está a conseguir expor a Frelimo como uma organização autoritária, a única responsável pela ausência de democracia em Moçambique. Acima de tudo, está a conseguir mostrar que a Frelimo não tem qualquer iniciativa para a paz e aprofundamento da democracia. Mesmo que ela própria, a Renamo, não seja modelo de uma organização democrática.

Sem iniciativa, a Frelimo está a reboque da Renamo, fazendo-se valer apenas da sua maioria parlamentar para se impor.

Como partido no poder, a Frelimo tem maior responsabilidade em criar o ambiente de concórdia que é necessário para permitir que a sua governação se torne viável.

A base operacional do actual debate político no país deve ser o entendimento de que o processo de descentralização do poder político é irreversível.

A questão de fundo, porém, é que esta descentralização deve ser entendida como parte de um processo de democratização das relações políticas no campo da eficiência e eficácia da gestão pública, e não como uma fórmula de partilha do poder. Para tal, deve ser resultado de uma interacção democrática para a busca de consensos mais vastos ao nível de toda a sociedade, visando o fortalecimento e consolidação da democracia.

Nesta perspectiva, a proposta de descentralização da Renamo não reflecte esta disposição democrática que seria a expressão soberana da maioria dos moçambicanos.

Na verdade, o que a Renamo propõe não é uma descentralização que torne mais aprofundado o processo democrático em Moçambique. Ela quer partilhar o poder. Ou melhor, uma integração ou acomodação na actual estrutura de governação que ela própria considera anti-democrática.

O ponto de partida para as exigências da Renamo é a sua asserção de que ela foi o legítimo vencedor das eleições de Outubro de 2014. Para a solução do problema, e para que a Renamo dê o dossier por encerrado, é preciso partilhar o poder. Ou seja, o ladrão partilhar o produto do roubo com o seu legítimo dono, e depois os dois passarem a embrenhar-se numa amizade indestrutível.

A Renamo pode ter elementos de prova que a tornem justificada nas suas reivindicações. Mas numa estrutura da Comissão Nacional de Eleições (CNE) que se tornou mais pesada devido à insistência para a inclusão dos seus membros, foram os seus próprios representantes naquele órgão que votaram para que os resultados fossem validados, antes da sua consagração pelo Conselho Constitucional.

Tudo dito, o problema entre a Frelimo e a Renamo é político. É nesse fórum onde ele deve ser resolvido, certamente não na instituição do parlamento.

Os direitos democráticos dos moçambicanos não podem ser sacrificados.
no altar deste expediente político.


Editorial, Savana 11-12-2015

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